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Reviewed by:
  • Tão longo amor tão curta a vida by Helder Macedo
  • Carlos Nogueira
Macedo, Helder. Tão longo amor tão curta a vida. Barcarena: Presença, 2013. Pp. 173. ISBN 978-972-23-4994-9.

A estreia de Helder Macedo (1935) como romancista dá-se em 1991, com Partes de África, que nasce da experiência africana e colonial do autor, cuja infância e pré-adolescência (até aos doze anos) está intimamente ligada a Moçambique. Seguiram-se Pedro e Paula (1998), Vícios e virtudes (2000), Sem nome (2005) e Natália (2009). Tão longo amor tão curta a vida retoma e desenvolve as grandes especificidades do universo romanesco de Helder Macedo: uma estilística, despojada mas muito ágil e sedutora, em que entram constantemente a antítese e o oximoro, tanto no discurso do narrador como nos diálogos; uma ironia e um humor imprevisíveis e muito apelativos que pedem a colaboração do leitor a propósito de temas e motivos tão diversos como o amor, a morte, a política ou a literatura; e a subversão da aura do literário ou de uma noção de escrita literária convencida da sua nobreza e superioridade.

A estrutura narrativa do romance depende diretamente da revolução que Macedo opera na construção do romance enquanto mundo que não é controlado por um narrador-autor omnisciente, mas sim pelo autor empírico, que é também personagem, e ao mesmo tempo pelas personagens. Nem o autor real nem o escritor-personagem que narra escondem as suas limitações em relação ao que contam. Macedo produz uma história em que a única certeza é a dúvida e a exploração irónica e inquiridora das possibilidades e das funções da literatura.

Há neste romance três linhas narrativas que se interligam: a história contada por um narrador a partir do que uma personagem diz ter acontecido; a história em que o narrador, um escritor que vive em Londres, preenche os vazios da vida que lhe é apresentada contando o que poderia ou poderá ter sucedido; e, no final, a história que é a convergência dessas duas histórias, cujo narrador o leitor tenderá a associar a Macedo, que usa esta estratégia para mostrar o processo de construção do romance. Daí uma passagem como esta, perto do final: “Mas a referência à ópera vem a propósito porque recebi uma mensagem do Victor Marques da Costa a dizer que está de novo em Londres, se nos podemos encontrar” (151).

Os primeiro quatro capítulos, “O nome”, “O Muro de Berlim”, “Metamorfoses” e “O sequestro” constituem a primeira parte; os seis seguintes, “A pneumonia”, “Tempo de fantasmas”, “Repetições”, “Igual e diferente”, “O lago esvaziado” e “Ao virar da esquina”, formam a segunda; e a terceira parte compreende dois capítulos, “O original e a cópia” e “Winterreise”. O leitor nunca perde a noção de que está perante um romance que não se quer “um livro como deve ser, daqueles que têm princípio, meio e fim, à inglesa” (163), como afirma ironicamente o narrador. E é assim porque, como dissemos, a ambiguidade atravessa do princípio ao fim este livro, que é, para aproveitarmos a fórmula que a personagem Victor Marques da Costa aplica aos romances do autor-personagem, um romance inconclusivo (12).

Inconclusivo, em termos práticos, porque o leitor não pode estar seguro de que este Victor Marques da Costa, um diplomata amigo do narrador-escritor português, viveu realmente pelo menos parte do que disse ter vivido. Ele garante que está ali, em casa do escritor seu compatriota, a solicitar ajuda, depois de ter conseguido fugir a uma mulher e a um homem que o haviam raptado; que essa mulher se lhe dirigira como se fosse a jovem cantora de ópera com quem, [End Page 179] cerca de vinte anos antes, tivera um relacionamento amoroso, e que nunca mais vira depois de o Muro de Berlim ter sido derrubado. Mas nada disto é inequivocamente confirmado nem desmentido. E também não sabemos se a mancha vermelha...

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