In lieu of an abstract, here is a brief excerpt of the content:

Reviewed by:
  • Mundivivências: Leituras comparativas de Guimarães Rosa by Luiz Fernando Valente
  • Luiz Gonzaga Marchezan
Valente, Luiz Fernando . Mundivivências: Leituras comparativas de Guimarães Rosa. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. 156 pp.

João Guimarães Rosa, ao lado de dois companheiros de geração - Clarice Lispector e João Cabral de Melo Neto - e de Machado de Assis encena o ato de escrever, colocando para seu auditório o ato enunciativo do processo ficcional. Guimarães Rosa, com essa atitude literária, promove, no âmbito do regionalismo literário nacional, a invenção da condição jagunça, por meio da expressão de um sentimento coletivo, espacializado e temporalizado no sertão e no interior das contradições do mundo.

As narrativas de Rosa, para isso, atuam com palavras novas; dão-nos, com aletrias, o inédito, conforme os prefácios de Tutaméia. Imagens de falas em que o erudito ouve o não erudito, nas narrativas do prosador mineiro, constituem-se tanto de situações que o autor manteve, conhecidamente, com a realidade sertaneja, por meio de anotações, como por invenções, fabulações. Para Luiz Fernando Valente, em Mundivivências, Tutaméia faz-se na "ars poética roseana" (19). Este volume, em nove capítulos, analisa, por meio de "estudos literários comparativos" (16) uma concepção da literatura de Guimarães Rosa. Conforme Mundivivências, os prefácios de Tutaméia promovem um "diálogo ativo entre o leitor e o texto" de Guimarães Rosa (20), uma vez que se constituem numa "díade da atividade do escritor e da mediação desempenhada pelo leitor" (27), além de expressarem "o ideário rosiano sobre a necessidade da ficção" (33).

Para Guimarães Rosa, narrar é agir; narrar é fazer conhecer através do dizer, das diegeses; narrar é fazer conhecer através da palavra. A linguagem literária, para Guimarães Rosa, manifesta, faz nascer uma dada realidade, oposta à outra, aparente, o que não se mostra sem a mediação da palavra, ou, conforme [End Page 275] posição de Valente: "a liminaridade e a mediação são conceitos centrais e complementares na obra rosiana, tanto no que diz respeito à temática quanto no que concerne à ontologia do texto literário e à concretização deste através do ato de leitura" (129). Entre o início de seus estudos através dos prefácios de Tutaméia e suas conclusões, momento em que considera "Uma estória de amor," Valente detém-se em "Campo Geral," Grande Sertão: Veredas, "A terceira margem do rio," "A hora e a vez de Augusto Matraga," "Buriti" e "A estória de Lélio e Lina." Nos seus estudos literários comparativos, Valente aproxima, no interior de suas análises, Rosa de Faulkner, Calvino e Tolstoi, movimentando, ainda, o seu método com reflexões em torno, principalmente, de Jung, Iser, Garbuglio, Nogueira Galvão, Benedito Nunes, Scholes, Vizzioli, Aiken, MacHale e Bataille.

"Campo Geral" faz-se no objeto de Valente para o estudo do papel do narrador rosiano afeito à encenação de vozes que advertem, moralizam e instalam no conto uma ambigüidade que tensiona a "percepção do mundo como algo fluido e contínuo" (239) que perpassa a formação de Miguilim, aprendiz, para Valente, das relações familiares e sociais, por meio da "matéria-prima da existência humana: a perda" (47), algo fatal na existência, uma travessia inevitável, marcante no curso da vida humana.

Grande Sertão: Veredas, até pelo modo como o narrador e protagonista interpela o seu interlocutor, constitui-se num volume de dúvidas, repassadas para o leitor por meio da assimetria daquela narrativa de Rosa em que Riobaldo ensina ao leitor o quanto é difícil viver, contar e ler. Para Valente: Grande Sertão: Veredas "faz extraordinárias exigências ao leitor, especialmente durante o assalto emocional ao qual o leitor [. . .] à medida que a leitura prossegue [. . .] vai aumentando sua capacidade de fazer sentido do material aparentemente caótico e ilegível com que inicialmente se depara" (58). Ou: "[. . .] sua interpretação nunca se reduz a uma...

pdf