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  • Gonçalves Dias: O poeta na contramão (Literatura e escravidão no Romantismo brasileiro) by Wilton José Marques
  • José Luís Jobim
Marques, Wilton José . Gonçalves Dias: O poeta na contramão (Literatura e escravidão no Romantismo brasileiro). São Carlos, São Paulo: EDUFSCAR, 2010. Bibliography. 280pp.

O professor Wilton José Marques, da Universidade Federal de São Carlos (SP), logo no início declara que esta sua obra se articula basicamente em função da [End Page 269] seguinte indagação: "O poeta Antônio Gonçalves Dias, que, a exemplo de outros autores românticos, tornou-se funcionário público através de relações de favor, poderia ou não criticar abertamente tanto a sociedade brasileira quanto a escravidão, que, por sua vez, era a mola sustentadora do próprio Estado que o empregava?" (p. 9) Sua resposta para a pergunta é "sim."

No que se refere à escravidão, o ensaio desenvolve uma reflexão sobre Meditação, obra de juventude do poeta maranhense, originalmente publicada na revista Guanabara, em meados do século XIX. Trata-se de uma análise, portanto, que tem duas vertentes: a primeira refere-se ao contexto social em que Gonçalves Dias se inseriu, enquanto a segunda tem em vista o diálogo que sua obra estabelece com o mencionado contexto.

Ao analisar o contexto, a hipótese adotada pelo professor Marques é a de que, em termos de sobrevivência econômica, não havia alternativa para os intelectuais românticos como Gonçalves Dias, a não ser a de se empregarem no aparelho do Estado, o que explicaria o destino profissional do poeta maranhense. E como a estruturação deste aparelho estatal era fundamentalmente clientelista, a própria contratação do funcionário dependia de uma indicação feita por alguém que tivesse poder no governo - e que, dentro deste raciocínio, normalmente esperaria algo em troca do favorecimento. O exame cuidadoso da trajetória de Gonçalves Dias, não somente através de dados por assim dizer "externos" (documentos, jornais de época, biografias), mas também "internos," na própria perspectiva que o poeta apresenta em suas cartas sobre o que estava acontecendo com ele então, permite ao leitor do livro de Wilton José Marques vislumbrar um homem dividido entre suas necessidades materiais (cuja satisfação demandava um emprego, que então só poderia ser público) e o olhar crítico em relação ao próprio sistema em que terá de inserir-se, para ter as necessidades atendidas.

Se a contradição é o nervo da vida, como disse Antonio Candido, Marques capta bem a contradição na carreira de Gonçalves Dias, desde o início, quando o poeta desabafa em carta que "essa gente que se dá comigo não sabe que independência que eu tenho na minha vida, nos meus atos e nas minhas opiniões," mas aceita o cargo oferecido de professor de latim e secretário do Liceu Niterói, mesmo reclamando que este lhe dará apenas a metade do dinheiro de que necessitava para viver. Este é um dos méritos do livro: o de oferecer ao leitor um quadro detalhado das relações sociais vigentes no Brasil (e mais especificamente no Rio de Janeiro), ao relatar como um autor vindo da província se movimentava na Corte imperial para conseguir um lugar ao sol.

O livro também é rico em informações sobre a produção de sentidos na época, em vários planos: na descrição de como se insere a obra gonçalvina no movimento literário do seu tempo; na análise das interseções entre autores, ideias e obras circulantes; na apresentação, ainda que sumária, de uma visão mais genérica da obra de Gonçalves Dias, antes de desenvolver a interpretação do texto específico do estudo: Meditação.

A vantagem desta perspectiva é poder, entre outras coisas, fazer observações com fundamento mais sólido sobre a correlação entre diferentes textos [End Page 270] da obra gonçalvina. Veja-se, por exemplo, a constatação por Marques sobre a semelhan...

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