Abstract

As obras de Machado de Assis dramatizam as ansiedades vividas no seio da sociedade brasileira do fim de século XIX, especialmente as tensões sentidas entre uma masculinidade ameaçada e uma feminilidade emergente. Este artigo examina dois dos romances que melhor definem as mudanças estilísticas da vida literária de Machado - Ressurreição (1872), o seu primeiro livro moldado ao estilo europeu; e Dom Casmurro (1899, a obra que marcou a sua passagem para um tom único e realista. Analisando a complexa relação de despeito e ternura que instiga os principais pares amorosos retratados nestas duas obras, eu procuro argumentar que o que impele os heróis de Machado (Félix e Bento) a paradoxal e simultaneamente vilipendiarem e cortejarem as suas amadas (Lívia e Capitu) é a ambivalência prevalente em uma sociedade patriarcal assustada pela crescente visibilidade social da mulher. Assim, discutindo as dicotomias recorrentes nos pares amorosos de Machado eu proponho um estudo aprofundado das razões por que Félix e Bento se alimentam do amor de Lívia e Capitu, respectivamente, enquanto ao mesmo tempo fortalecem o seu temperamento derrotista ao procurar falhas nas musas que os adoram. Este artigo procura também respostas para o porquê destas mulheres de força aceitarem um papel tão ingrato na vida dos seus consortes, urdindo assim um ensaio acerca da labiríntica importância que a masculinidade (ou a falta dela) e a feminilidade (ou o excesso desta) têm numa sociedade patriarcal em pânico.

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