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Hello, Hello Brazil: Popular Music in the Making of Modern Brazil Duke University Press, 2004 By Bryan McCann

Tendo por ponto de referência a influência do rádio na vida brasileira do final dos anos 20 até meados dos anos 50, Hello, Hello Brazil: Popular Music in the Making of Modern Brazil tece um quadro analítico das complexas e múltiplas relações de poder envolvidas no processo de re-significação da música popular brasileira. Através de sua análise, Bryan McCann nos leva a repensar o processo de construção de configurações identitárias, em uma conjuntura marcada pela presença de uma crescente urbanização e industrialização, políticas nacionalistas e a expansão da mídia. McCann procura identificar as fissuras, contradições, exclusões e conflitos, trazendo ao lume uma multiplicidade de vozes e perspectivas que ajudaram a consolidar e problematizar uma idéia de nação.

O primeiro capítulo se volta para a relação entre Estado e cultura, examinando o papel desempenhado pelo rádio durante o governo de [End Page 290] Getúlio Vargas. O segundo capítulo retoma a transposição do samba de um espaço de marginalização para ícone de identidade nacional. Apesar de ser um tema já tratado por outros pesquisadores, a referência ao samba crítico de compositores como Geraldo Pereira traz novas nuances para essa discussão. Pautando-se nas letras de algumas das canções de Pereira, McCann aponta para a presença de um posicionamento que faz vislumbrar uma crítica a uma prática racista e discriminatória. Em "The Rise of Northeastern Regionalism" a ênfase recai sobre as figuras de Dorival Caymmi e Luiz Gonzaga—reconhecidos ícones da música regional brasileira. Para além da relação entre regionalismo, nacionalismo e mercado consumidor, McCann discute a forma como os dois compositores se aproveitaram de sua imagem para reivindicar melhorias para suas regiões, rompendo com uma visão reducionista que percebe o artista como um joguete nas mãos dos 'poderosos.' O quarto capítulo aponta para uma relação de amor e ódio entre a música popular brasileira e os Estados Unidos, concentrando-se, mais especificamente, nas décadas de 1930 e 1940. Tomando como base de sua argumentação a música "Canção para inglês ver," de Lamartine Babo, o autor reflete sobre um processo de negociação da influência estrangeira que se inicia. Isto implica questionar uma visão dicotômica que tem persistido em classificar as músicas dessa época como marcadas ora por um nacionalismo que rejeitava a influência estrangeira, ora pela imitação do pop americano. Além disso, a referência à contribuição de alguns produtores norte-americanos na inovação do cinema e da música popular brasileira rompe com uma sistemática simplista que tradicionalmente percebe a influência americana como algo pernicioso. O quinto capítulo retoma a questão da autenticidade que ressurge na proposta da volta dos chorinhos em programas de rádio. Almirante e Pixinguinha foram os nomes mais influentes nessa busca pelas raízes da música popular brasileira. Os dois últimos capítulos examinam os fãs clubes, os programas de auditório e os anúncios veiculados nas rádios. O ponto marcante desses capítulos prende-se na possibilidade de abrir um espaço não só para a análise das diferenças de classe e das preferências nos programas de auditório, mas também por permitir a veiculação da fala desse público – um dado que provoca o questionamento dos limites de cidadania a que estavam sujeitos. Da mesma forma, a discussão em torno da publicidade e as implicações no que concerne ao financiamento do Estado trazem importantes facetas para esse estudo.

O que se pode, por fim, observar no livro é a constante preocupação, diante da complexidade de seu objeto, em abordá-lo em seus múltiplos aspectos, obrigando-nos a refletir sobre alguns dos conceitos e práticas que estruturam a sociedade brasileira. Nesse sentido, pode-se afirmar que o livro abre trilhas para novos desenvolvimentos e aprofundamentos no que concerne à íntima relação entre cultura, mídia e política. Trata-se, portanto, de uma leitura obrigatória para todos aqueles que se interessam pelo Brasil.

Kátia da Costa Bezerra
The University of Arizona

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