In lieu of an abstract, here is a brief excerpt of the content:

Latin American Music Review 22.1 (2001) 83-97



[Access article in PDF]

O Charme Chique da Canção de Chico Buarque:
Táticas carnavalescas de transcender a opressão da ditadura

Steven F. Butterman


No mundo da literatura contemporânea, a música é muitas vezes condenada e relegada a uma posição inferior no gênero da poesia. Esta atitude é injusta, especialmente quando consideramos o papel fundamental da música na cultura popular brasileira da atualidade. Augusto de Campos observa, em 1972, que: "In the new chapter of Brazilian poetry that began in 1967, everything, or almost everything, ends up on records" (Perrone, Seven Faces: Brazilian Poetry since Modernism, 87).

Chico Buarque de Hollanda, até hoje a figura indisputavelmente mais importante no desenvolvimento da Música Popular Brasileira (MPB) durante os anos 60, 70, e 80, (Masters of Contemporary Brazilian Song 1) nasceu em 1944. A produção musical dele é dividida principalmente em duas fases--o sentimentalismo nostálgico (canções de amor) que surgiu no início da sua carreira, e a vontade crítica--do governo, das injustiças da sociedade--enfim, a música de protesto, que começou com "Tem mais samba" e "Olê Olá", e outros, nos primeiros anos da década de sessenta e vigorosamente continuou, apesar do opressivo Ato Institucional No. 5 (1968-78) através dos anos 70 até a Abertura, culminando com o seu famoso "Vai passar" em 1984. Embora o autor deste ensaio não consiga esconder uma predileção pela música popular brasileira, o propósito não consiste em exoticizar o Brasil frente ao resto do mundo numa louvação da sua grandeza musical. De qualquer maneira, porém, acho pertinente avaliar a produção musical de Chico Buarque e o papel e impacto da MPB em geral, junto com tendências de música de protesto de ordem geral e, ao mesmo tempo, isolar o caso do Brasil e o caso do Chico para melhor apreciar a sua contribuição à consciência coletiva brasileira. Charles A. Perrone, no seu recente livro, Seven Faces: Brazilian Poetry since Modernism, exprime um fenômeno curioso que este trabalho tentará entender: "In assessments of contemporary Brazilian poetry, the place of song . . . is simply much greater than in [End Page 83] North American or European literatures" (89). No mundo de música popular ocidental--ou pelo menos, os intelectuais que comentam sobre a sua relação com a sociedade em geral, Chico Buarque não cabe, como veremos. Também, num mundo que geralmente relega ao status de inferioridade o papel da música como gênero de literatura, é necessário destacar, ou pelo menos sugerir, as forças culturais--ou melhor, na cultura da política--que provocam, no Brasil, grande profundidade, valor e comunicabilidade na música. Com certeza, a índole relativamente alta de analfabetismo contribui, pelo menos em parte, ao desenvolvimento de formas orais para exprimir as preocupações, os prazeres, o sofrimento duma coletividade. Porém, mantenho que a visão arquetípica do Carnaval e as suas manifestações sócio-políticas na sociedade brasileira, criam as condições necessárias para o florescimento de tradições musicais no Brasil--seja o ritmo dionisíaco do samba, ou a canção poética de Chico Buarque que catarticamente se volta ao carnavalesco para poder oferecer, ao nível acessível do povo, a possibilidade de transcender as duríssimas condições impostas pela ditadura militar. A MPB funciona, e, como veremos, particularmente as contribuições de Chico, porque trata a liberdade em todos os sentidos--psicológica, política, econômica, sexual, etc. Porém, Chico Buarque merece mais mérito do que chamar-lhe de ópio; com certeza, ele é mais do que uma espécie de droga que o povo pode tomar (ou tocar, no caso) para entrar no mundo utópico do Carnaval. Chico emprega o discurso carnavalesco para desconstruir a rigidez da hierarquia da sociedade brasileira, encontrada, no seu nível mais absoluto, na ditadura militar...

pdf