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Reviewed by:
  • Erico Verissimo, escritor do mundo: Circulação literária, cosmopolitismo e relações interamericanas by Carlos Cortez Minchillo
  • Luís Augusto Fischer
Minchillo, Carlos Cortez. Erico Verissimo, escritor do mundo: Circulação literária, cosmopolitismo e relações interamericanas. São Paulo: Edusp, 2015. 320 pp. Notes. Bibliography.

Bem editado como livro, fruto de pesquisa minuciosa e bem focada, expresso em redação fluente, sobre tema relevante e nada óbvio, enfim uma incontestável contribuição para os estudos de literatura e de história cultural no Brasil—eis uma pequena série de indiscutíveis verdades acerca do trabalho de Carlos Cortez Minchillo. De fato, trata-se de um produto raro, ao reunir tantas capacidades e realizações.

A própria equação inicial do trabalho já mostra virtudes: trata-se de examinar três romances de Erico Verissimo (1905-1975), escolhidos por trazerem a marca (raríssima para escritores brasileiros) de transcorrerem em cenários fora do Brasil. São eles Saga (1940), O Senhor Embaixador (1965) e O prisioneiro (1967), que têm por cenário a Espanha do tempo da Guerra Civil, a hipotética república antilhana de Sacramento e uma guerra no Sudeste Asiático, presumivelmente o Vietnã, respetivamente. Essa escolha, ao mesmo tempo em que destaca uma parte menos prestigiada da obra desse escritor, aponta para um nexo importante, que o trabalho examina a contento, entre obra e vida, já que Erico teve experiência internacional marcante, muito superior à média de sua geração e mesmo à de qualquer outra no país: excetuados os escritores-diplomatas, como é o caso notório de João Cabral e Guimarães Rosa, talvez nenhum outro tenha vivido a trabalho tanto tempo no exterior, em cargos também raros para um escritor sem formação acadêmica—Erico tinha ensino médio no Brasil, mas deu aulas em universidades norte-americanas, fez conferências pelo país afora e foi diretor de Assuntos Culturais da Organização dos Estados Americanos.

Acresce que Erico foi também, ao largo de sua vida adulta, um importante editor brasileiro, atuando numa das maiores editoras de sua época, a Globo, de Porto Alegre. Nela, empregou seu talento e seu esforço em tarefas as mais variadas, como a tradução, a redação de textos para a famosa revista da casa, a seleção e contratação de livros, no Brasil e fora dele. Enquanto compunha sua vasta obra—onze romances, um dos quais em sete volumes, alguns livros de contos, vários para público infantil e escolar, quatro narrativas de viagens, escritos autobiográficos, uma biografia, ensaios, centenas de cartas e muita outra coisa—encontrou tempo para traduzir mais de quinze títulos do inglês e para ser esse importante mediador cultural, atuando no Brasil e fora dele, o que inclui acompanhar traduções de seus livros para outras línguas, entre as quais o inglês, no mercado estadunidense. Aliás, um dos motes do estudo se liga diretamente a isso: Minchillo procura, com bons resultados, explicar por que Erico foi traduzido ao inglês nos EUA já nos anos 30 e ao longo da política de Boa Vizinhança daquele país com a América Latina, na Segunda Guerra, mas depois deixou de interessar àquele mercado.

E nem falamos ainda de sua impressionante trajetória como cidadão de seu tempo, que nunca se furtou a tomar posição política e torná-la pública, alinhado [End Page E22] com a democracia contra qualquer ditadura—a de Vargas ou a dos militares no Brasil, o fascismo, o nazismo e o comunismo soviético—e com valores humanistas que ele considerava socialistas, tudo isso numa quadra histórica que cobrava clareza e em geral empurrava o escritor ou o intelectual para apenas uma de duas posições, ou americanófila, ou comunista. Erico, que viveu três temporadas nos EUA a convite e era um amigo da narrativa anglo-saxã, passou a ser alvo constante de ataques por isso—vale registrar que o trabalho de Minchillo recupera essa trajetória em detalhes, no miúdo da relação entre esses lances...

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