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Reviewed by:
  • As paixões de Pessoa by George Monteiro
  • Carlos Pittella-Leite
Monteiro, George. As paixões de Pessoa. Trans. Margarida Vale de Gato. Lisbon: Ática, 2013. 338 pp.

As paixões de Pessoa, o novo livro de George Monteiro, é importante e inovador por pelo menos três razões distintas: por ser uma tradução sem livro original, por estudar Pessoa no âmbito da literatura inglesa e, enfim, por representar a internacionalização de um poeta nacional que cada vez atravessa mais fronteiras, tanto políticas como linguísticas. Portanto, tratarei nesta resenha do livro como objeto, como conteúdo inovador e, finalmente, como símbolo.

Comecemos pelo livro como objeto. A competente tradução de Margarida Vale de Gato, subvencionada pela FLAD, não contava com um livro em inglês publicado que lhe pudesse servir de original—não no sentido que comumente emprestamos ao conceito “livro original.” Ao buscar o original para avaliar a qualidade da tradução, surpreendi-me ao descobrir que se trata de uma compilação de artigos revistos e inéditos, agrupados pela primeira vez sob o instigante título As paixões de Pessoa.

O agrupamento de artigos em livros ensaísticos frequentemente carece de unidade—o que não é o caso deste livro, também original em conteúdo. Monteiro entretece diversas “Paixões de Pessoa,” cada capítulo costurando mais um sentido à palavra “paixão.” Contudo, não se trata apenas de paixões sob o signo de Eros, como no conhecido caso de Pessoa e Ofélia, também abordado pelo texto (capítulo 6). Muitos trataram da presença de Ofélia na vida e obra do poeta. A inovação de As paixões de Pessoa está em tratar a vida e obra pessoana—inclusive o caso de Ofélia—sob a luz de um poeta transnacional, apaixonado por mais de uma língua e por diversas literaturas. Não se surpreenda, pois, o leitor ao se deparar com Ofélia em meio a um ensaio que aproxima Pessoa de Edgar Allan Poe! Ainda que a relação já tenha sido previamente estabelecida, Monteiro oferece insights e conexões inesperadas, associando o “Corvo” de Poe ao “Mons-trengo” pessoano do livro Mensagem.

Desde o prefácio, Monteiro apresenta Pessoa como um amante da língua e literatura inglesas: “Esperava que o reconhecessem como poeta de língua inglesa, e as suas esperanças equiparavam-se às de John Keats que, ferido com os ataques públicos ao seu trabalho, predisse (decerto com mais bazófia do que com certeza), ‘Julgo que me contarão entre os poetas ingleses depois de morrer’” (12). Se a Pátria de Pessoa foi a língua portuguesa, sua “mátria” teria sido a inglesa, onde primeiro se aventurou pela literatura—e onde nunca deixou de se posicionar, como atestam os ensaios de Monteiro.

Sendo ensaístico, o livro não inclui inéditos, mas decerto estabelece relações inéditas, tais como com Arthur Hugh Clough (1819–1861), Ernest Dowson (1867–1900) e Gil Vaz (capítulos 4, 5 e 7, respectivamente). Embora a conexão com Gil Vaz (1898–1977) seja inovadora, o âmago de As paixões de Pessoa en-contra-se nas intertextualidades entre Pessoa e poetas de língua inglesa, abrindo uma série de portas para a internacionalização dos estudos pessoanos. Ainda, Monteiro dispõe-se a situar o poema “Antinous” na tradição da literatura inglesa, [End Page E48] esclarecendo em minúcia as dívidas e rupturas de Pessoa para com outros versejadores do provocativo amante de Adriano.

No ensaio derradeiro, Monteiro aborda desafios de tradução envolvendo um texto de cada um dos grandes heterônimos pessoanos (Caeiro, Campos, Reis), além do poema ortônimo “Autopsicografia.” Em 1996, no seu estudo The Presence of Camões (U of Kentucky P) Monteiro já se debruçara sobre as tentativas do próprio Pessoa em traduzir poesia portuguesa para o inglês, como na versão em inglês que Pessoa fez do célebre soneto de Camões “Alma minha gentil …” O tema da tradução entre os dois idiomas...

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