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Reviewed by:
  • Machado de Assis: Multiracial Identity and the Brazilian Novelist by G. Reginald Daniel
  • Pedro Meira Monteiro
G. Reginald Daniel. Machado de Assis: Multiracial Identity and the Brazilian Novelist. University Park: The Pennsylvania State UP, 2012. 344 pp.

Machado de Assis: Multiracial Identity and the Brazilian Novelist, de G. Reginald Daniel, é uma contribuição importante para a compreensão de Machado de Assis (1839–1908), não apenas no âmbito da já rica bibliografia crítica em inglês, mas também entre os estudos sobre o autor publicados em outras línguas.

A “questão racial” que está no centro das preocupaçôes de Daniel tem ocupado os críticos machadianos, especialmente na última década. É preciso lembrar que durante muito tempo Machado de Assis foi uma figura incômoda para aqueles que buscavam evidências em sua obra de algo que se pudesse identificar como uma consciência racial ou étnica. A obliquidade que marca seus escritos é especialmente aguda quando se trata da questão racial. Ou seja, muitas vezes Machado fala da raça sem de fato mencioná-la, a não ser por alusôes, ou por meio de enredos complexos nos quais a questão é subliminar. No entanto, os leitores de Machado de Assis sabem que quanto mais alusivo mais forte é seu texto.

A situação se torna ainda mais complexa se lembrarmos que Machado, mulato ele mesmo, jamais lutou abertamente contra o “embranquecimento” que possibilitou sua ascensão social, bem como sua canonização no panteão da literatura brasileira. Seria um equívoco buscar nele as feridas abertas pela condição mulata que se encontram num Lima Barreto, por exemplo—autor que, ao lado de Luís Gama, Daniel alinha a uma “tradition of opposition”. A questão é delicada, afinal Machado de Assis testemunhou a crise do sistema escravista no Brasil, a própria abolição da escravidão (1888) e as decepçôes diante da promessa republicana brasileira. Assim sendo, o enfrentamento da questão racial em Machado por G. Reginald Daniel vem em muito boa hora.

Retomando alguns de seus estudos anteriores, Daniel traça um panorama histórico e sociológico da ordem racial brasileira, aprofundando sua diferença em relação à matriz segregacionista norte-americana, mas também realçando a ambiguidade da ideologia da democracia racial. Em um universo onde a exclusão social combina-se com uma “inclusão seletiva”, a figura do mulato pode emergir como peça central do quebra-cabeça da questão racial brasileira, estabelecendo o paradoxo que foi o de Machado de Assis e de tantos outros: “African Brazilian writers’ efforts to avoid or minimize the topic of race in order to appeal to a larger white constituency played a decisive role in deracinating an explicit African Brazilian literary consciousness” (40). Parte do segredo do livro de Daniel talvez esteja nesse par: o “desenraizamento” do orgulho racial, e a consequente possibilidade de falar sobre raça resistindo, no entanto, a tudo aquilo que seja “explícito”. [End Page 117]

Além da criteriosa retomada biográfica de Machado de Assis, o estudo de Daniel analisa, em consonância com a crítica especializada, os momentos em que a escravidão reponta na ficção e na crônica machadianas. Mas a verdadeira volta do parafuso, que aperta e dá sentido ao livro de Daniel, está no desvio em relação à busca de sinais inequívocos de um compromisso de Machado com a delação da discriminação racial. Dirigidas antes para as motivaçôes psicológicas dos personagens, as lentes machadianas recairiam sobre os impulsos que comandam a ação do sujeito, sondando então os sentimentos contraditórios que enformam a tragicomédia humana, feita da mais séria e da mais risível das matérias. Nas palavras de Daniel, “most of the main characters in Machado’s writings experience a crisis of identity as they confront their incongruous and ambiguous world, between conscious desires and deeper motivations and the choices they make. Yet, instead of being defined by their moral goodness or badness, they are a complex blend of doubt coupled with hope, pride, egoism, and ambition...

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