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  • Interesses culturais e âmbitos receptivos em dous romances sobre o Caminho de Santiago: Frechas de ouro e O enigma de Compostela
  • Elias J. Torres Feijó

Aproximações aos tipos de textos literários produzidos na actualidade sobre o Caminho de Santiago (CS), salientavam o romance históricomedievalista e a tendência esotérica como o principais (Chao 2006). Produtos significativos polo seu consumo massivo e/ou polos âmbitos em que circulam, pendentes de análise, parecem corroborar essas dominâncias e as actuais: cfr. o diário de viagem Ich bin dann mal weg: meine Reise auf dem Jakobsweg (2006; na sua versão em espanhol Bueno me largo, 2009), que leva bem mais de 3.000.000 de exemplares vendidos; o capítulo nº 43, “Demonology”, da série Criminal Minds (2009) ou Tarnished Beauty / Señor Peregrino / Don Peregrino na sua versão portuguesa Don peregrino (2010), traduzido para nove línguas e bestseller na Noruega. As duas vertentes, presentes na obra mais condicionante do olhar sobre o Caminho de Santiago na actualidade: O Diário de um Mago (DM), de Paulo Coelho.

Os discursos dominantes sobre o CS e as suas práticas constituem um repertório de possibilidades conformado indissolúvel e dialecticamente; nos centos de anos do CS, os últimos trinta anos são decisivos, registrando-se um aumento importante das visitas a Santiago e da peregrinação mui significativo (Rey e Ramil 2000; Oficina del Peregrino 2011).

Três são os principais discursos contemporâneos sobre o CS e Santiago de Compostela (SC): os elaborados pola Igreja Católica, particularmente os realizados por João Paulo II nas suas visitas a Santiago de Compostela; as Declarações de organismos internacionais de grande [End Page 135] abrangência, nomeadamente do Conselho da Europa e da UNESCO; e o texto DM, de Paulo Coelho e todos os que a este estão ligados (Torres 2011). O discurso da Igreja Católica assenta sobre três linhas: caracterização de SC e, sobretudo, o Caminho e a peregrinação como um histórico elemento vertebrador da Europa; identificação do cristianismo como raiz da identidade e a coesão europeias e a identificação de Santiago, do Apóstolo e do Caminho como meta e processo de conversão e superação católicas. Um trecho de um dos seus discursos de 1982 em Santiago, singularmente elaborado de forma anafórica e enfática, sintetiza estes objectivos, ficando célebre uma parte (em itálicos) que foi gravada numa lápide à entrada do mausoléu do Santo na Catedral compostelana:

Yo, Obispo de Roma y Pastor de la Iglesia universal, desde Santiago, te lanzo, vieja Europa, un grito lleno de amor: Vuelve a encontrarte. Sé tú misma. Descubre tus orígenes. Aviva tus raíces. Revive aquellos valores auténticos que hicieron gloriosa tu historia y benéfica tu presencia en los demás continentes.

(João Paulo II, 1982)

Esta linha foi reforçada significativamente em 1989, com a celebração em SC da “IV Jornada Mundial da Juventude”, num contexto de sensível mudança política no continente e no objectivo de dar pautas de comportamento utilizando como referências o Caminho e a significação do Apóstolo, alicerçadas na frase bíblica: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14:6).

O Diário de Um Mago (DM) é apresentado quase sistematicamente sob estas coordenadas: procura/transformação individual; concepção religiosa-mística da vida; procura da felicidade. Salienta a massiva leitura misteriosa, iniciática e esotérica do mesmo: Wikipedia “Diário”, s.d.; “The Pilgrimage”, s.d.; catálogos comerciais (da Livrarias Saraiva, direccionado desde o site oficial de Coelho para compra on-line, “O Diário de um Mago. 2ª Ed. 2010”, s. d.; da Círculo de Leitores, “Coelho. O Diário de um Mago”, s.d.) e catálogos académicos: o da Congress Library outorga-lhe o número BF1999, correspondente às Ciências Ocultas. Vendidas milhões de cópias (não há cifras certas divulgadas), além do acesso gratuito na internet (Coelho 2001), o autor foi tentando...

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