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ESTUDOS DA CULTURA E REGIME ESTÉTICO: POSICÓES E OPOSIÇOES RAUL ANTELO Universidade Federal de Santa Catarina 1. Identidade: original, anoriginal Em suas "Teses sobre o problema da identidade" (1916), Walter Benjamin afirma que toda nâo-identidade é infinita, o que näo quer dizer que toda identidade seja finita ou mesmo circunscrita. Ou seja que é impossível definir os nao-valores ainda que, de outro lado, seja igualmente impossível discriminar os auténticos valores. O retorno angustioso de certas questöes e de seus impasses— tal o caso dos valores—póe a nu, como diz Jean Luc Nancy, até que ponto estamos expostos ao impossível e como isso mesmo nos confère condiçao humana, e por esse mesmo motivo, inesgotável. Por isso nao deve nos surpreender se, mesmo sem contato aparente com a reflexäo benjaminiana, um artista como Duchamp tenha cunhado o conceito de infraleve justamente para dar conta do mesmo impasse e, a seu modo, responder a mesma pergunta benjaminiana que ele proprio se formula em suas Notas: se "dans le temps un même objet n'est pas le même à 1 seconde d'intervalle. Quels rapports avec le principe d'identité?". Em outras palavras, na época da reproduçâo técnica, intelectuais e artistas como Benjamin e Duchamp descobrem que os valores encontram-se disseminados e aqueles traços que outrera definiam a verdade e abelezacomo entes imutáveis e sublimes apontam hoje täo somente a um semblante, o nada. Como isto veio a serpossível? É portodos conhecido o fato mmm de que o belo da arte quis, classicamente, se identificar com o sublime e acabou fisgando sua sombra, a nao-arte. Ora, toda vez que julgamos a artisticidade de um objeto, sua legítima inscriçao no campo da beleza, separamos, a rigor, a arte da näo-arte e, consequentemente, fazemos com que o anestético se torne o verdadeiro conteúdo da estética. É esse o paradoxo do ready-made em sua tentaiva de ultrapassar o binarismo que separa o estético do anestético.© 2000-2001 NUEVO TEXTO CRITICO Vol. XIII-XIV No. 25/28 24___________________________________________________RAUL ANTELO Diante do ready-made, o julgamento crítico, que se gaba de praticar um prazer desinteressado, uma universalidade sempartipris, uma finalidade sem fim aparente e umanormalidade anti-normativa, depara-se täo somente consigo mesmo, ou antes, com sua imagem invertida e, em consequência, com seu proprio vazio. Ou ainda, ao separar o natural do artificial, para assim melhor viabilizar seu julgamento de valor entre o estético e o anestético, a propria idéia de natural recua e, com ela, surge um ideal de restauraçâo. Nesse sentido, e da mesma forma em que a ecología pode ser considerada uma restauraçâo postiça do natural, a crítica de valores restaura o fetiche da originalidade da arte, através da emergencia da nao-arte. O Benjamin final, ou antes, certos usos contemporáneos de suas idéias fornecem involuntaria energía ao ideal restaurador, tanto em sua vertente ativa quanto na reativa.' Com efeito, a resposta do Benjamín maduro, a do famoso ensaio sobre a obra de arte, redigido trinta anos após as teses sobre a identidade há pouco evocadas, parece contradizer a transvaloraçâo dos valores do escrito juvenil. De fato, o ensaio de 1936 afirma que todanäo-identidade é infinita mas também postula que toda identidade é nao menos finita. A opçâo do epílogo ao ensaio nao deixa muitas dúvidas. Apenas duas posicóes säo éticamente possíveis: a politizaçâo comunista da arte ou a estetizaçao fascista da política. Creio que, a diferença dessa disjuntiva excludente, que leva os atuais restauradores do partidismo a tachar toda discussäo estética de simplesmente fascista, ou qualquer abordagem antiinstitucional de pura amnesia bárbara, caberia formular para essas questöes uma saída näo dilemática, a de um regime estético que nâo se identifica, necessariamente, com a lógica rupturista das vanguardas. 2. O regime estético Esse regime estético opöe-se , de fato, à abordagem...

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