Abstract

A actividade pre-heteronímica de Fernando Pessoa não se limitou ao domínio da escrita, mas também à leitura da sua biblioteca por parte de alguns dos seus pre-heterónimos. Neste ensaio, interrogamo-nos precisa-mente sobre a génese do desenvolvimento heteronímico a partir desse outro espaço, a biblioteca, onde, já nos tempos de Durban, o poeta começara a cultivar o seu fascínio pela alteridade. A relação entre a marginalia nos vários livros assinados por alguns dos pre-heterónimos (Pip, David Merrick, Lucas Merrick, Sidney Parkinson Stool, Charles Robert Anon e Alexander Search), as listas de projectos, certos poemas e outros escritos breves destas primeiras personalidades literárias demonstram a que ponto a experiência do desdobramento esteve ligada, desde cedo, a uma efervescente actividade de leitor — de escritor-leitor e, gradualmente, de leitor-escritor. A presença dos pre-heterónimos, enquanto proprietários de livros, estende-se ao longo de quase uma década, desaparecendo por volta de 1910, uns anos antes da eclosão dos heterónimos. Contudo, esta viragem não fechará a biblioteca à figura de Caeiro, cujo nome, como veremos, aparece de forma diversificada nas margens, capa interior e sobrecapas de algumas obras desta biblioteca plural.

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